martes, 26 de abril de 2011

SImone


Oi kerida gente! Tudo bem?

Nós estamos felizes, cheias de outono no corpo, como quem começa um novo ciclo. Curtindo ainda a palestra e conversas com a Clair Castilhos. Foi bem bom. Para quem perdeu, ou para quem “ganhou” e quer continuar a ler sobre o tema, subimos um texto dela, aqui. Também as fotos.

Para esta quinta-feira, como combinamos na reunião passada, começaremos a ler a uma das Grandes Mães do feminismo. A tão falada, mencionada e nem por isso tão lida Simone de Beauvoir. Nós queremos saldar uma divida pendente com nossas expectativas e começaremos a ler O Segundo Sexo. Tomara algumas das compas do MTD, que tão bem tem trabalhado este livro, possam assistir ás reuniões. Subimos os 2 livros na nossa página.

Para esta quinta-feira vamos começar lendo a Introdução do I livro, Fatos e Mitos. Por favor imprimam e tragam para a reunião.

Esperamos vcs na quinta-feira 28 de abril, 18,30 hs entre Utopias e Lutas, nos altos da Borges.

Abraços rebeldesssss

Breve história da mulher e seu corpo



Clair Castilhos Coelho[1]

Dentro da fêmea Deus pôs

Lagos e grutas, canais,

Carnes e curvas e cós

Seduções e pecados infernais

Em nome dela, depois

Criou perfumes, cristais

O campo de girassóis

E as noites de paz.

(Tororó, Chico Buarque, 1988)

1. O CORPO MÁGICO E AS VAGINAS DENTADAS

Uma das preocupações mais importantes do feminismo é o questionamento da ordem sexual dominante. A partir desta foi construído um ideal feminino segundo o qual é avaliado, julgado e disciplinado o comportamento da mulher em todas as nuances de sua vida.

A saúde é, talvez, o mais importante foco desses controles opressivos e estereotipados, pois trás consigo o domínio do corpo e a vivência da sexualidade. A saúde da mulher, além dos aspectos mais gerais dos fenômenos que ocorrem no ciclo vital de todas as pessoas, inclui de forma predominante os assuntos da reprodução e suas diferentes fases. Estas se caracterizam por mudanças no corpo internas e externas. Muitas vezes a falta de compreensão e a ignorância sobre o aparecimento de episódios como a menarca, a menstruação, a gestação, o parto, o puerpério, o climatério e a menopausa tornaram o corpo feminino motivo de curiosidade e atração. A vida da mulher, marcada pelo sangue, pelos humores, hormônios e alterações cíclicas, era muitas vezes relacionada aos ciclos da natureza, às fases da lua, aos equinócios e solstícios, aos movimentos da terra e aos rituais da semeadura e da colheita, às deusas da fecundidade e da beleza. Continham uma conotação mística, às vezes até divina, despertavam sensações de coisas inalcançáveis e de difícil controle. Segundo Vandana Shiva, “na maioria das culturas do mundo, a fertilidade da terra e dos corpos das mulheres têm sido símbolos poderosos da riqueza, diversidade e vitalidade da natureza e da reprodução da vida e da sociedade”. (Carneiro, 1993)

Toda essa multiplicidade de sentimentos e crenças ao mesmo tempo em que conferia um sentido poético, sagrado e misterioso, também estimulavam um conjunto de rituais que tanto eram de adoração como de repressão, terror e medo. Nas origens culturais são encontradas diversas lendas que tentavam explicar a fertilidade das mulheres. Quando não eram entendidas geravam relatos fantásticos “de vaginas dentadas ou devoradoras que ameaçavam os homens com seu poder”. (Sanchez, [1984?]) Essas diferentes interpretações da vida sexual e reprodutiva das mulheres transformaram o ciclo vital da fêmea da espécie humana em algo que deveria ser observado com desconfiança e que precisava ser conhecido para ser subjugado. As transformações do corpo feminino durante o crescimento, desenvolvimento e envelhecimento, ao despertar tantas indagações, algumas sem resposta, tornaram-no objeto de crendices e controvérsias. Com o passar do tempo alimentaram os preconceitos que restringiram e limitaram a vida e a sexualidade das mulheres.

Para controlar o poder fantasiado da sexualidade e da fertilidade femininas, a história da humanidade e da própria ciência está marcada de exemplos cruéis: cinturões de castidade, cerimônias culturais de controle como a infibulação, clitoridectomias para o tratamento da masturbação, violência crescente no parto mediante o uso de procedimentos, artefatos e manobras além dos maus tratos psíquicos. (Sanchez, [1984?])

Os preconceitos e discriminações foram validados pelas diferentes culturas, ciências e religiões em todos os tempos.

2. O CORPO, O PECADO E A CULPA.

“A razão natural para isto é que ela é mais carnal que o homem, como fica claro pelas inúmeras abominações carnais que pratica. Deve-se notar que houve defeito na fabricação da primeira mulher, pois ela foi formada por uma costela de peito de homem, que é torta. Devido a esse defeito, ela é um animal imperfeito que engana sempre.”

(Kramer e Sprenger, 1991) “Malleus maleficarum”, Parte I, Questão 6)

Na nossa sociedade ocidental judaico-cristã, os principais mecanismos utilizados para a submissão da mulher são a culpa, o pecado original, o culto da castidade e da virgindade, o casamento monogâmico e o ato sexual destinado apenas à reprodução. Uma grande influência do ascetismo e do gnosticismo levaram o Cristianismo a esse pessimismo sexual. Houve um verdadeiro culto à castidade dos homens, em alguns casos induzindo-os a auto castração como um grandioso ato de amor a Deus.

Na Idade Média, os tenebrosos processos de heresias, movidos pela Inquisição, durante mais de cinco séculos de repressão e terror, custaram às mulheres a morte nas fogueiras sob acusação de bruxaria. Em livros famosos como “O martelo das feiticeiras” ou “Malleus Maleficarum” a misogínia e o ódio às mulheres era estimulado. Esse sentimento justificava as abomináveis e cruéis torturas praticadas pela inquisição contra as mulheres.

Os relatos históricos informam que elas eram as médicas, farmacêuticas e parteiras, matronas e curandeiras de suas comunidades. Detinham grande conhecimento das plantas medicinais e suas propriedades, faziam chás, breves, benzeduras, poções, emplastros, enfim exerciam a arte de cuidar e curar. É interessante lembrar que feiticeira significava mulher sábia.

Enquanto ocorriam avanços reais no desenvolvimento das ciências médicas, tornava-se imprescindível acabar com a influência dessas grandes médicas do povo. Deve-se ressaltar que as mulheres são as responsáveis por várias descobertas científicas, o que sempre foi ocultado pela ciência dominante. Por exemplo, em relação às plantas medicinais são antigas as denominações de alguns glicosídeos cardiotônicos como a digitalis lanata - dedaleira, que possui este nome porque sua flor tem a forma de um dedal, dos antiespasmódicos, como a atropa belladona, que produz a atropina e a matricaria camomila, ambas para cólicas, tanto das mães como das crianças. E, como não poderia deixar de ser, a maioria das fórmulas líquidas, quando são diluídas ou fracionadas, invariavelmente partem de uma solução-mãe!

Quando surgiu o chamado Racionalismo médico, baseado nos estudos de Anatomia, as primeiras observações empíricas, a dissecação dos cadáveres, estes saberes provenientes do interior dos mosteiros medievais, dos “copistas” que registravam os conhecimentos dos antigos e toda a ciência da época, eram de nítida extração clerical.

Começava a se impor o pensamento racionalista e com ele uma medicina científica, ponderal, empírica e experimental, claramente masculina, patriarcal e religiosa. Medicina esta que, apesar de todo o discurso Iluminista, nunca perdeu a influência da Igreja, tanto nos saberes como nas práticas. As controvérsias sobre o aborto que perduram até os dias de hoje são um exemplo clássico.

Havia decisão e intenção de afastar as mulheres destas práticas que elas haviam desenvolvido desde o começo da divisão das tarefas entre o homem e a mulher.

Esse poder/saber foi em grande parte subtraído das mulheres. O conflito tornou-se inevitável, embora tenha iniciado alguns séculos antes.

O momento seguinte foi o das Ciências Naturais, da Biologia, Fisiologia e Anatomia. Até porque seria insustentável, devido aos avanços científicos advindos com as novas concepções políticas e filosóficas do Iluminismo, continuar mantendo a mulher submissa e inferiorizada somente com o suporte das religiões. Foi preciso substituir as sanções e limites impostos pela religião, baseados na culpa e no pecado, por concepções mais condizentes com o pensamento da época. A religião como forma de opressão sobre a mulher foi substituída pela Medicina.

“A Medicina se situa entre a Biologia e a Política. Entre o “misterioso” mundo do laboratório e a vida cotidiana. É a disciplina encarregada de fazer a interpretação pública dos fatos biológicos, é a que administra os frutos médicos dos avanços científicos. A Biologia descobre os hormônios; os médicos são os encarregados de anunciar que os “desequilíbrios hormonais” fazem da mulher um sujeito incapaz de desempenhar tarefas públicas. Em termos gerais, pode se afirmar que a biologia se encarrega de rastrear as origens da doença, enquanto os médicos decidem quem está doente e quem não está.” (Ehrenreich e English, 1980)

É nessa fase que a influência da Medicina e da Biologia, entendidas como verdadeira base conceitual das práticas de saúde e das múltiplas formas de intervenção no corpo das pessoas humanas, assume um papel hegemônico na interpretação e explicação dos fenômenos ligados à sexualidade e à reprodução.

O sistema médico tem uma importância estratégica para a libertação da mulher. É o guardião da tecnologia reprodutiva - do controle da natalidade, do aborto e dos meios para garantir certo grau de segurança durante o parto. Representa a possibilidade de liberação de centenas de medos silenciosos e queixas que tem limitado a vida da mulher ao longo da história. Quando exigimos o controle sobre nossos corpos, o exigimos em primeiro lugar ao sistema médico, já que as chaves estão em seu poder”. (Ehrenreich e English, 1980)

Uma das possíveis causas pelas quais o movimento feminista tem entre suas principais bandeiras de luta a questão da saúde, repousa na necessidade de desvelar o conteúdo dessa história longínqua, resgatar esse saber ancestral que foi usurpado, investigar onde reside a explicação das origens da expropriação do corpo da mulher pelo sistema médico.

“No entanto o sistema tem, também, uma importância estratégica para a opressão sobre a mulher. A ciência médica tem sido uma das armas mais poderosas da ideologia sexista em nossa cultura. Em última instância, é a justificativa para a discriminação sexual - na educação, no trabalho e na vida pública - que surge daquilo que diferencia o homem da mulher: SEU CORPO”. (Ehrenreich e English, 1980)

Com o passar do tempo a soma destes ingredientes: uma ciência que nunca foi neutra, a opressão cultural, a religião, a hegemonia do patriarcalismo e a exploração capitalista gestou um quadro de horror. Quadro este que é manifesto na expropriação do corpo da mulher, na opressão à sexualidade, na normalização da reprodução, na medicalização, na desumanização da assistência, na violência do atendimento ao aborto, seja espontâneo ou não, e na indiferença quando termina o ciclo reprodutivo.

3. ENFIM, “... NÃO NASCEMOS MULHERES, NOS TORNAMOS MULHERES”! (Simone de Beauvoir)

Em (Kramer e Sprenger, 1991) quando Rose Marie Muraro escreve a introdução histórica do “Martelo das Feiticeiras” ela desvenda e analisa as modificações impostas às vidas das mulheres e dos homens em diferentes períodos históricos. É marcante a tentativa de dominação dos corpos, dos desejos, da sexualidade, da imposição de racionalidades médicas limitantes e voltadas para a opressão.

Quando cessou a caça às bruxas, no século XVIII, houve grande transformação na condição feminina. A sexualidade foi limitada por inúmeras normas, o orgasmo era considerado coisa do diabo sujeita a punição. As mulheres foram reduzidas ao espaço doméstico. O saber feminino popular caiu na clandestinidade sendo muitas vezes apropriado pelo poder médico masculino que já se tornara hegemônico. As mulheres, dominadas e sem direito e nem acesso ao estudo como na Idade Média passaram a transmitir, voluntariamente, a seus filhos valores patriarcais já absorvidos por elas. Como resultado da caça às bruxas foi normatizado o comportamento de homens e mulheres europeus, tanto no espaço público como privado. Assim se passaram os séculos.

Os seres humanos, domesticados e condicionados por uma cultura patriarcal estão preparados para o advento do capitalismo e de sua medicina de raiz positivista mercantil e medicalizante.

A sociedade de classes que já está construída nos fins do século XVIII é composta de trabalhadores dóceis que não questionam o sistema.3

O século XIX é um marco na transição entre o passado medieval, a era moderna e a cultura contemporânea. Além das revoluções e lutas libertárias que ocorrem na Europa, aumenta a urbanização, o crescimento das cidades, os aglomerados urbanos, a reestruturação e o saneamento das cidades e ao final, a entrada da mulher no mercado de trabalho. No final do século XIX e início do século XX a nova realidade resultante do trabalho produtivo e remunerado das mulheres é rompida. O limite estrito que existia entre o público e o privado, entre a reprodução biológica (no universo privado) e a venda da força de trabalho (esfera coletiva da produção industrial) fica visível. Assistimos ao surgimento de mais uma mercadoria no capitalismo em plena expansão – a mulher trabalhadora.

Surgem os questionamentos sobre as famílias extensas, a família nuclear, patriarcal, e aparece como resultado, a visibilidade da opressão sobre a mulher.

Ainda nesse século, são produzidos os primeiros artefatos de contracepção. Com o transcorrer do tempo os métodos anticoncepcionais aparecem na cena social trazendo consigo as possibilidades de libertação da mulher da obrigatoriedade da concepção, a alternativa do controle populacional, a transgressão aos ditames religiosos de sexo só para a reprodução.

Em 1949 Simone de Beauvoir publica o livro “O segundo sexo”. A condição feminina é examinada em todas as suas dimensões: a sexual, a psicológica, a social e a política. O livro transforma-se num forte instrumento para sistematizar e explicar de forma clara e incisiva as grandes indagações que faziam as mulheres em busca da sua liberdade e emancipação. A autora questiona a invisibilidade das mulheres e afirma: “O certo é que até aqui as possibilidades da mulher foram sufocadas e perdidas para a humanidade; já é tempo, em seu interesse e no de todos, de deixá-la enfim correr todos os riscos, tentar a sorte”. (Beauvoir, 1980)

A controvérsia, o debate, o antagonismo estavam instalados e faziam parte integrante do cenário da época.

Outro aspecto que também se desenvolve são os estudos, pesquisas e as novas práticas relativas à contracepção e à concepção. Ou seja, a questão da reprodução e da sexualidade continuava como foco das preocupações.

“O interesse pela reprodução é, sem dúvida, ancestral e sua expressão evidente são os mitos e ritos universais da fertilidade. Entretanto, até o século XIX, os procedimentos usuais de regulação da fertilidade não foram tecnológicos, mas sim predominantemente, comportamentais. Contam-se aí a amamentação, a abstinência e o coito interrompido, freqüentemente, associados às práticas abortivas ou de infanticídio. O uso de apetrechos para impedir a concepção se restringia às experiências médicas e aos grupos de elite, não ficando excluídas as formas sagradas e profanas de livre sexualidade”. (SOS – Corpo, 1990)

Em 1960 foi lançada a pílula anticoncepcional. Os eventos na área da reprodução multiplicaram-se de forma acelerada. Vários métodos anticonceptivos de base hormonal, com diferentes vias de administração, processos de tratamento da infertilidade, fertilização “in vitro”, embriões congelados, “úteros de aluguel”, vacina anticoncepcional, entre outros, e os que ainda virão, tornam cada vez mais necessária a definição de novos conceitos e paradigmas que combinem a ciência, a ética, a bioética, o desejo das mulheres de ter ou não ter filhos, o direito de decidir sobre o próprio corpo, o aborto, a religião e a laicidade do estado e da ciência, a saúde física, mental e ambiental e as políticas públicas de saúde e demografia.

Esse complexo elenco de variáveis chegou às esferas internacionais, e às Conferências da ONU sobre população, desenvolvimento, direitos humanos, meio ambiente, mulher, eqüidade e paz.

4. “MEU CORPO ME PERTENCE”![2]

A discussão e estudo dessas questões remetem, decisivamente, para o campo da saúde e seus serviços.

Para que estas interfaces sejam contempladas é necessário que se utilize o conceito de direitos reprodutivos. Este conceito é uma construção teórico-conceitual elaborado pelo movimento de mulheres e referendado em Amsterdã em 1984, no Tribunal Internacional do Encontro sobre Direitos Reprodutivos” que ocorreu no 8º Encontro Internacional Mulher e Saúde. Segundo (AVILA, 1993) “a novidade em relação aos direitos reprodutivos é que são uma invenção das mulheres participando, como sujeitos, da construção de princípios democráticos. O feminismo é o locus político e filosófico dos direito reprodutivos, é, na sua história ocidental, uma luta por igualdade. A ONU reconhece, na Conferência de Nairobi em 1985 que a promoção dos direitos da reprodução é uma aquisição fundamental das mulheres para uma justa posição na sociedade.

A partir destas considerações, DIREITOS REPRODUTIVOS são os direitos das mulheres de regular sua própria sexualidade e capacidade reprodutiva, bem como de exigir que os homens assumam responsabilidades pelas conseqüências do exercício de sua própria sexualidade.

A abrangência desse conceito envolve a contracepção, esterilização, aborto, concepção e assistência à saúde.

Além do mais é visto na perspectiva dos direitos humanos ampliando o seu sentido e retirando a função da reprodução da esfera privada, avançando para além do planejamento familiar, ou seja, saí do âmbito meramente familiar e passa a se localizar no espaço da sociedade como um todo.

Trabalhar com direitos reprodutivos significa entender que foi ampliada a abordagem sobre o assunto. O Relatório da Conferência do Cairo, 1994, reflete a agenda de prioridades que as mulheres construíram assim como demonstra que elas também redirecionaram o eixo da questão populacional. A partir daí o planejamento familiar perde força como conceito e emerge, com grande destaque o conceito de Direitos Reprodutivos como parte integrante dos Direitos Humanos.

A busca do consenso sobre os conceitos de direitos reprodutivos e direitos sexuais ocupou grande parte da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, - CIPD – 94, Cairo, 1994. (ONU, [1985?])

Ao final, a declaração contempla as diferentes posições e o consenso é obtido mediante intensa negociação para obter consensos e ao mesmo tempo resistir à pressão das forças fundamentalistas lá presentes.

Segundo a Plataforma de Ação, § 96, da CIPD – 94, [Ver também CIPD Programa de Ação, § 7.34]1 (ONU, [1985?])

“Os direitos humanos das mulheres incluem seu direito de controle e decisão, de forma livre e responsável, sobre questões relacionadas a sexualidade, incluindo-se a saúde sexual e reprodutiva, livre de coerção, discriminação e violência. A igualdade entre mulheres e homens no que diz respeito à relação sexual e reprodução, incluindo-se o respeito à integridade, requer respeito mútuo, consentimento e divisão de responsabilidades pelos comportamentos sexuais e suas conseqüências”.

Mas, à luz da CIPD – 94, Programa de ação, § 7.3 o que são os direitos reprodutivos e a saúde reprodutiva?

“Os direitos reprodutivos abrangem certos direitos humanos já reconhecidos em leis nacionais, em documentos internacionais sobre direitos humanos e em outros documentos consensuais. Esses direitos se ancoram no reconhecimento do direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número de filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito de gozar do mais elevado padrão de saúde sexual e reprodutiva”.

“Os direitos reprodutivos incluem o direito de todos os indivíduos exercerem controle sobre seus próprios corpos e de viverem relações sexuais consensuadas, livres de violência e de coerção, assim como de contraírem matrimônio com consentimento livre e pleno de ambas as pessoas. Os direitos reprodutivos são essenciais para que as mulheres exerçam seus direitos à saúde, incluindo-se o direito a serviços integrais e de boa qualidade, que assegurem privacidade, informação completa, livre escolha, confidencialidade e respeito.” (ONU, [1985?]).

É perceptível que na linguagem consensual, própria da diplomacia internacional, a formulação não é tão explícita como no conceito de Amsterdã, de 1984, mas mesmo assim foi considerado um avanço, levando-se em conta a conjuntura da época.

A inclusão de direitos reprodutivos na perspectiva dos direitos humanos amplia o seu sentido e retira reprodução da esfera privada, avançando para além do planejamento familiar, ou seja, saí do âmbito meramente familiar e passa a se localizar no espaço da sociedade como um todo. Contempla a antiga palavra de ordem do movimento feminista: “Filho não é só da mãe, é do pai, da família, da sociedade e do estado”.

O pensamento patriarcal, como já foi visto, alimenta-se dos preconceitos, realiza-se na opressão cultural e concretiza-se na qualidade dos serviços de saúde oferecidos às mulheres. A conseqüência dessas coisas na formulação, implementação e oferta de serviços de saúde, claramente interfere na qualidade dos mesmos.

Na 4ª Conferência Mundial da Mulher – Igualdade, Desenvolvimento e Paz, Beijing, 1995, assim como as decisões do Cairo 1994, são retomadas e garantidas. Na declaração está explícita a recomendação aos países signatários para revisarem a legislação punitiva sobre o aborto. É sem dúvida uma grande progresso para a consolidação dos direitos reprodutivos.(ONU,1996)

5. O BRASIL E A SAÚDE DE SUAS MULHERES.

No Brasil, o Sistema Único de Saúde é a política de Estado onde convergem as diferentes demandas e onde ocorrem as disputas na hora de definir as prioridades e os recursos para a implementação dos serviços de assistência à saúde.

Um bom exemplo dessas contendas é a verificação dos avanços e recuos dos programas destinados à saúde da mulher. Historicamente, as políticas de saúde da mulher eram vinculadas à maternidade e à infância, os conhecidos “Programa materno-Infantil”. O movimento feminista lutou sempre por programas destinados à promoção, proteção e recuperação dos corpos femininos, independentes do período reprodutivo/gestacional.

Em 1983 foi implantado o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM). Um conjunto de estratégias que atuavam em todo o ciclo vital da mulher. Não durou mais do que 10 anos e não chegou a ser implementado em todo o país. 10

Estudos recentes demonstram que a abordagem predominante, na assistência à saúde da mulher, continua sendo a materno infantil (com inclusão do planejamento familiar) abrange apenas 18,2% dos municípios brasileiros pesquisados. Ou seja, restritos à Atenção Básica. A situação é mais grave quando a pesquisa aponta que apenas 1,9% dos municípios brasileiros cumprem o que seria a “atenção semi-integral” – categorias que se aproximam das diretrizes propostas pelo PAISM.11

Atualmente, o foco está voltado para o Programa de Saúde da Família (PSF) outra estratégia perigosa, para as mulheres, pois as dilui no interior da família patriarcal, machista e nuclear.

A situação descrita é relevante quando se observa que as mulheres são as principais usuárias do SUS. Em 1999 consumiram 62% das internações hospitalares, proporção que se eleva para 75% na idade reprodutiva. São as principais consumidoras de medicamentos, tanto dos necessários, como vítimas da empurroterapia e do descaso com que são tratadas suas queixas, em geral transformadas em receitas de antidepressivos (2/3 das usuárias de medicamentos controlados), são também, as principais cuidadoras, atendem os doentes de suas casas, muitas vezes sem a menor orientação, ministram a medicação, freqüentam os centros de saúde levando seus filhos, são o maior contingente dos servidores de saúde em quase todas as categorias de profissionais de saúde. Portanto, um papel estratégico dentro do SUS mas tratado como uma questão subalterna.

Hoje, no Brasil, está sendo implementada pelo Ministério da Saúde, através da Área Técnica da Saúde da Mulher, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Um conjunto de Princípios e Diretrizes e um Plano de ação previsto até 2007.12

Estas ações programáticas visam reduzir as principais causas de adoecimento e morte das mulheres. Segundo os dados apresentados no Plano do Ministério da Saúde, no Brasil, as principais causas de morte da população feminina são as doenças cardiovasculares, destacando-se o infarto agudo do miocárdio e o acidente vascular cerebral; as neoplasias, principalmente o câncer de mama, de pulmão e o de colo do útero; as doenças do aparelho respiratório, marcadamente as pneumonias (que podem estar encobrindo casos de AIDS não diagnosticado); as doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas, com destaque para o diabetes. E as causas externas.

Outro aspecto que chama atenção é que a mortalidade ligada ao ciclo gravídico-puerperal e ao aborto não aparece entre as dez primeiras causas de óbito nessa faixa etária.

No entanto, a gravidade do problema é evidenciada quando se observa que a gravidez é um evento relacionado à vivência da sexualidade, portanto não é doença, e que, em 92% dos casos, estas mortes maternas são evitáveis. Outro dado que impressiona é que alguns estudos mostram que grande parte das mulheres que morrem de causas ligadas ao parto realizou o pré-natal, o que remete à qualidade dos serviços prestados, além disso, há uma alta incidência de sífilis congênita, 12 casos/1000 nascidos vivos, no SUS, a hipertensão arterial é a maior causa de morte materna e apenas 41,01% das gestantes inscritas no Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento receberam a segunda dose de vacina antitetânica. O aumento da incidência de DST/AIDS atinge níveis preocupantes e a transmissão heterossexual é uma das principais vias, notadamente mulheres monogâmicas, casadas, pobres, residentes em cidades de porte médio e interior. Isso caracteriza a interiorização e pauperização da epidemia, segundo o já citado documento do MS.

Além de toda essa situação descrita ainda ocorrem graves problemas relacionados às mulheres negras, índias, lésbicas, trabalhadoras rurais e urbanas, adolescentes, as vítimas de violência doméstica, de assédio sexual, com especificidades de morbo-mortalidade que na maioria das vezes não são consideradas quando do planejamento e implementação das ações de promoção, proteção e recuperação da saúde.

A análise do perfil epidemiológico das mulheres brasileiras evidencia que as maiores causas de adoecimento e morte são a pobreza, o preconceito, a discriminação, a medicalização do corpo e a precariedade da assistência. Precariedade esta é intensificada e agravada quando se considera que a política econômica adotada nas últimas décadas se contrapõe aos princípios do SUS. Portanto, o SUS, apesar de ser uma política de Estado é contra hegemônico em relação às políticas de governo e dificultando a concretização de programas de caráter universalista, como foi o caso do PAISM e a atual Política.

A covarde subserviência ao capital financeiro, nacional e internacional, resulta nessa desumana inversão de prioridades colocando a saúde e o bem estar do povo como valores que podem ser negligenciados em favor de acordos internacionais com o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial.

Segundo a visão desses organismos internacionais a saúde trata-se de bem privado que os indivíduos se apropriam em quantidades variáveis. A saúde é uma responsabilidade privada, uma mercadoria, que as pessoas adquirem mediante pagamento, portanto quem tem mais dinheiro compra mais saúde.

No início do terceiro milênio a tarefa mais urgente é a necessidade de enfrentar a extraordinária hegemonia do pensamento neoliberal, a exploração de classe exacerbada na ditadura do mercado; o fundamentalismo religioso e o misticismo; a volta/permanência de preconceitos contra a mulher e a obrigação de oferecer à população serviços de saúde dentro dos princípios e diretrizes do SUS.

É um desafio que precisa ser enfrentado por todos e todas. É preciso ganhar a sociedade para que haja superação dessa lógica que impede o desenvolvimento humano e a justiça social.

O que fica cada dia mais claro é que o capital, o patriarcado e a morte andam juntos. Há um capital da morte fortalecido pelo fundamentalismo do patriarcado. Não será preciso buscar a morte do capital e a superação do patriarcado? A ruptura é a tarefa que se impõe!

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. CARNEIRO, F. Ciclos da Vida. Rio de Janeiro, REDEH, 1993. 111 p.

2. SANCHEZ, L. H. Reproduccion, patriarcado y poder. In: Primer Encuentro Regional sobre la salud de la mujer. 1984, Colômbia. Es Preciso Volar!, Ed. Gazeta. Bogotá, D.E. p.89 – 94. [1984?].

3. KRAMER, H.; SPRENGER, J. O martelo das feiticeiras: “Malleus maleficarum”. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1991. 528 p.

4. EHRENREICH, B., ENGLISH, D.. “Inválidas” o “Contagiosas”: Sexismo en el Saber y la Práctica Médica. (Trad. de. Dora Cardaci y Lourdes Alvarez). Universidad Autónoma Metropolitana, Xochimilco, 1980. Original Inglês.

5. BEAUVOIR, S. de. O Segundo Sexo: 1. Fatos e Mitos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. 309 p.

6. SOS CORPO – Grupo de Saúde da Mulher (Recife). Viagem ao mundo da contracepção: um guia sobre os métodos anticoncepcionais. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1990. 223 p.

7. ÁVILA, M. B. Modernidade e cidadania reprodutiva. Rev Estudos Feministas. CIEC/ECO/UFRJ, 1993; 2:382-93.

8. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Relatório da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, Cairo, 1994. Brasília: FNUAP/CNPD, [1995?].

9. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Conferência Mundial da Mulher, 4, Beijing, 1995. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1996.

10. BRASIL. Ministério da Saúde. Assistência Integral à Saúde da Mulher: bases de ação programática. Brasília: Centro de Documentação, 1984. 26 p.

11. MARCHIORI, B., LEITE, F. Só 20% das cidades têm SUS ideal à mulher. Folha de São Paulo, 15 fev. 2005. Cotidiano, p.3.

12. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: princípios e diretrizes. Brasília: Editora MS, 2004. 82 p.


[1] Farmacêutica – Bioquímica, Mestre em Saúde Pública

Professora Adjunta IV do Departamento de Saúde Pública da UFSC

[2]Palavra de ordem do movimento feminista nos anos 70.

lunes, 18 de abril de 2011

Feminismo pra frente


A 40 AÑOS DEL PRIMER CUESTIONAMIENTO DE LA MATERNIDAD POR LAS FEMINISTAS EN MÉXICO

Francesca Gargallo

Repasar la historia del feminismo es siempre un hecho muy grato. En tiempos de estudios de género y de evaluaciones de proyectos, recordar cómo las mujeres hemos sido capaces de organizarnos de forma espontánea para dotarnos de nuestros métodos y fines, sin obedecer a ningún criterio externo, para lograr nuestra liberación y romper con un sistema global y totalitario de control sobre nuestros cuerpos -su libertad de movimiento y sus derechos al placer- y sobre las elecciones que tomamos al respecto, nos ofrece una bocanada de aire fresco. Y quizá nos vuelva a inspirar…

El 9 de mayo de 1971, hace 40 años, cuando yo tenía 14, me reunía con mis amigas a la salida de la escuela y vivía lejos del México de la represión de los estudiantes y trabajadores críticos, cuando los socialistas gobernaban en Chile y los rusos habían invadido Checoslovaquia, cuando Rossana Rossanda escribía en Il Manifesto denunciando el machismo de la política y sus horarios masculinos (también los de los dirigentes del movimiento estudiantil de 1968), cuando Angola y Mozambique luchaban contra el colonialismo portugués, cuando en las universidades y las escuelas se pensaba en la educación de masa y se actuaba la autogestión en el diseño de los propios planes de estudio y cuando surgían grupos feministas de un nuevo tipo, que desechaban la idea de emancipación e igualdad con el hombre, para decirle al mundo que entre mujeres podían volver a nombrar la realidad en femenino y actuar en consecuencia (para darnos una idea, grupos como el muy politizado Mujeres en Acción Solidaria, de México), pues el 9 de mayo de 1971 sucedió algo espectacular.

Quinientas mujeres que se nombraban feministas, que tenían entre 17 y 45 años, que habían actuado en sus casas, en sus lugares de trabajo, en sus estudios, en sus relaciones amorosas, para lograr que sus amigos y sus enemigos no se rieran de ellas cuando hablaban de la liberación de las mujeres, cuando cambiaban las llantas ponchadas de sus autos, cuando construían con serrucho y martillo sus libreros, cuando aprendían a conducir las motos, cuando hablaban en femenino, cuando se enojaban por los piropos callejeros y las miradas lascivas de los hombres que las querían devolver a las casas donde maltratarlas sin ser juzgados y cuando denunciaban la violación como un acto de odio y la maternidad como una imposición social que no tiene nada de natural… quinientas mujeres se dirigieron a las 12 del día al parque Sullivan de la Ciudad de México, en cuyo frente campea una pesada estatuaart déco conocida como el Monumento a la Madre.

Y ahí se manifestaron, un día antes del día inventado por el periódico Excélsior y la tienda departamental Palacio de Hierro como Día de la Madre (inventado para contrarrestar el avance de las mujeres que cuatro décadas antes manifestaban su sufragismo post revolucionario, pues durante el gobierno de Cárdenas, muchas de las feministas de principios del siglo XX creyeron sinceramente que obtendrían ese derecho al voto activo y pasivo que la Asamblea Constituyente de 1917 les había negado con el pretexto que la política no era de interés para las mujeres, a pesar de su masiva participación en el proceso revolucionario).

Un día antes de ese día que desquicia las calles, las tiendas y los restaurantes de México, quinientas feministas dijeron que la maternidad no es natural, que es una opción en la vida de las mujeres, y reivindicaron su derecho al aborto libre y gratuito en caso de quedar embarazadas contra su voluntad.

Han pasado 40 años desde ese día memorable en que las feministas mexicanas empezaron a deshacer el mito de la mamacita que nos quiso antes de conocernos (como si fuera posible querer a alguien que no se conoce). Y con eso reivindicar que las mujeres somos y podemos ser muchas cosas más que madres.

En el resto del mundo, el feminismo se manifestaba masivamente en las calles de París, Roma, San Francisco, Berlín, Nueva York. Lo intentaba también en Santiago, Buenos Aires y Bogotá, pero en América Latina, eran increpadas por sus “compañeros”, hombres revolucionarios que las acusaban de querer romper la unidad del pueblo en su lucha contra el capitalismo por reivindicaciones pequeñoburguesas. Los curas católicos por primeras vez se hicieron eco de las condenas de los comunistas. Y los secundaron médicos, legistas, padres, maridos y otras alimañas.

Pero las mujeres, tercas como indios, jugándose la vida en un acto como ellos, a sabiendas que no tenían más chance que ese, se encogieron de hombros ante sus reclamos, y se reunieron entre sí, nombraron el mundo en diálogo entre mujeres, fundaron revistas, invadieron las universidades. En pocas palabras, hicieron de su autonomía de los partidos, de las iglesias y los estados, la forma de rebelarse al status quo misógino del patriarcado en el que estaban (y están) inmersas. Se lanzaron al mundo generando desde el seno de su movimiento ideas y modos que no eran sujetos a los criterios establecidos desde fuera de su estar entre mujeres.

En unos años de algarabía y propuestas múltiples, su rebelión alcanzó lo cotidiano y se volvió parte del modo de vivir de una entera generación de mujeres. Entonces el estado, garante de los derechos de los privilegiados, ya no la pudo impedir y, en vez de reprimirlas, intentó gobernarlas.

En México, lo hizo antes que en otros lados. En 1975 el estado mexicano, ese estado priista que durante 70 años tapó las más brutales represiones con un discurso sui generis que apelaba a los valores revolucionarios para no permitir la manifestación de nada que le fuera extraño, clamó por la ayuda nada menos que de la Organización de las Naciones Unidas y con ella se hizo cargo de las primeras jornadas mundiales sobre los derechos de las mujeres, para mediatizarlas.

Muchas feministas se manifestaron en el escenario que levantó la ONU en México para dar inicio a la primera Década de la Mujer. Por primera vez una lesbiana, la poeta Nancy Cárdenas, se hizo portavoz del derecho a una sexualidad no determinada por la relación con un hombre para las mujeres; las mujeres trabajadoras de los sectores populares no reconocidos se hicieron presentes en la voz de Domitila Chungara; antropólogas, médicas, amas de casa manifestaron su malestar ante el acoso cotidiano de un sistema que las discriminaba en masa, sin distinciones.

De inmediato, el estado mexicano respondió concediendo a las mujeres mexicanas el derecho a pasar su nacionalidad a las hijas e hijos, aunque los tuvieran con un padre extranjero y fuera de las fronteras nacionales. Nada mal, considerando que un derecho parecido las italianas y las francesas lo lograrían más de una década después y las suizas no lo tienen aún hoy en día. Pero poca cosa considerando el reclamo de las feministas a una vida digna; y, sobre todo, cosa peligrosa porque instaló la práctica que los gobiernos pueden conceder a las mujeres algo a cambio de regular sus demandas y reconducir sus movimientos a la gobernabilidad.

Quince años después, el movimiento feminista mexicano no existía más. En su lugar, las feministas se habían dispersado en un sinnúmero de Organismos No Gubernamentales, asociaciones, grupos de servicios, escuelas, organizaciones sociales y otras instituciones de y para las mujeres que recibían dinero a cambio de implementar políticas sociales que servían al estado para reconducir a las mujeres a los objetivos del estado.

Claro está, que esto implicó que el estado hiciera concesiones, que ofreciera equidad entre los sexos, perdón entre los géneros (se me olvidaba, para reconducir a la razón a las mujeres el sistema fue muy hábil: así como logró que el lenguaje político desterrara la terminología que remitía a la lucha de clases apelando al concepto gramsciano de sociedad civil, hizo que el lenguaje feminista dejara de hablar de los antagonismos entre mujeres y hombres y recondujera a las mujeres a la relación con el hombre, relación social, por lo demás, generalizando la categoría feminista de “géneros” -gender, en inglés- que de hecho las volvía a invisibilizar). En fin, que el estado pusiera a las mujeres a trabajar para autojustificarse o autoinculparse de sus males.

Mientras… Bueno, en los últimos 24 años en México han sido asesinadas por mano de hombres 36.000 mujeres, pero si las feministas nos atrevemos a denunciar el feminicidio generalizado e impune que esto significa, los medios de comunicación masiva y los politólogos y los especialistas por ellos invitados a opinar sobre nosotras, nos responden que tal cosa no existe, que las mujeres mueren en menor cantidad que los hombres en el clima de violencia en que estamos todos sumergidos.

Hoy en día, dado el retroceso que las mujeres experimentamos en nuestra buena vida y que se evidencia en la trata masiva de jóvenes y niñas para la prostitución forzada, en la impunidad con que la justicia confronta la violencia y los asesinatos de las mujeres, el hecho que la derecha se venga sobre nuestro derecho a tomar decisiones soberanas sobre nuestros cuerpos y castiga la obtención del aborto legal en la Ciudad de México condenando a las mujeres fértiles de 17 estados a llevar a cabo un gestación aún en casos de violación, riesgos para la salud e incompatibilidad con el propio proyecto de vida, hoy en día siento el despertar de un nuevo feminismo autónomo.

Jovencitas y viejas activistas que se negaron al contubernio con la gubernabilidad del “género femenino”, están volviendo al diálogo entre mujeres. Les vale un bledo que en Chile las académicas hablen de “feminismo sin mujeres” y que las financiadoras presionen para que en los encuentros feministas las y los trangéneros sean considerados del “género femenino”. Ellas vuelven a sus cuerpos, los escuchan, reconocen su historia en ellos. Las que aman sus menstruaciones y las que las detestan intercambian sus sentires, intercambian sus conocimientos acerca de la fabricación de toallas de tela no desechables, dialogan acerca de la medicalización forzada de sus ciclos vitales.

Los pequeños grupos de feministas, muchas de ellas de la periferia de las grandes ciudades, hijas de la migración del campo o desempleadas fabriles, y también universitarias que quieren expresarse contra la lógica que pretende que los estudios son una especie de carrera para cumplir con cuotas de egreso y no la posibilidad de construir y adueñarse del propio saber, todas ellas manifiestan su molestia antes las carísimas reuniones que las especialistas de género realizan en los grandes hoteles de las ciudades capitales o turísticas. Se reúnen en una sala, reacomodan un garaje, se hacen de una cafetería solidaria y, sobre todo, se niegan a comprar su comida sólo en lugares donde puedan emitirles una nota fiscal: le compran a la señora de al lado, buscan las cooperativas agrícolas femeninas para tener acceso a productos ecológicos y baratos. Ante el recorte de sus tiempos que ha implicado el trabajo en las condiciones impuestas por el neoliberalismo, dialogan por internet y planean sus reuniones como un día de fiesta.

En Chihuahua, las madres de las mujeres asesinadas junto con feministas que reivindican el derecho a una vida libre de violencia como primer paso para una liberación de nuestros cuerpos en el espacio público y privado, se enfrentan al estado, le reclaman derechos y acciones, a la vez que se juntan y reconfiguran sus modos propios de ser mujeres. Así, en todo el país, y a pesar del baño de sangre en que está sumergido, las mujeres de los más diversos grupos vitales empiezan a ver en las políticas sociales que el sistema dominante les ofrece como limosna algo que no les gusta; eso es, empiezan a ver las políticas sociales como lo que son: un mecanismo sustancial de la modalidad renovada de dominación mundial del capital transnacional, donde gobiernos, Banco Mundial, ONU, alianzas militares internacionales, Fondo Monetario Internacional, ONGs y organizaciones que promueven las políticas sociales están coludidos de una forma u otra para gobernarlas.

Hoy las mujeres vuelven los ojos a lo obvio: no somos una masa indefinida, no tenemos derechos por nosotras mismas, no somos todas iguales y los privilegios de los hombres y de todo aquello que se asocia con la masculinidad no han sido tocados. El surgimiento de diversas formas de feminismos autónomos entre las jóvenes de las barriadas urbanas y de los pueblos indígenas habla muy bien de la insumisión de las mujeres.

Por supuesto, la pertenencia a un pueblo o a una nación originaria es condición para la acción feminista tanto como lo es la pertenencia a cualquier estado nacional. Las mujeres no inician un proceso de lucha por sus derechos, reivindicando su cuerpo, su imaginario, su espacio y sus tiempos en la revisión total de la política porque son francesas o mixes, mexicanas o mapuches, suecas o zapotecas, sino porque un sistema que otorga privilegios a los hombres, y a lo que considera proprio de ellos, las oprime. La acción feminista es una confrontación con la misoginia, la negación y la violencia contra el espacio vital de las mujeres, que emprendemos cada vez que nos reconocemos en el espejo una de la otra y dialogamos entre nosotras.

En otras palabras, a 40 años de ese histórico 9 de mayo de 1971, cuando 500 mujeres se dirigieron al Monumento a la Madre en la Ciudad de México reclamando el derecho a una maternidad libre y voluntaria, el feminismo sigue siendo una acción del entre-mujeres ahí donde el entre-mujeres es mal visto, menospreciado, impedido, es objeto de burla o de represión. El feminismo hoy como hace 40 años es un acto de rebeldía al status quo que da pie a teorizaciones y a muchas prácticas.

Las mujeres occidentales trabajando por sí mismas en colectivo han impulsado esos cambios sobre sus derechos al estudio, el trabajo, la participación política que hoy los estados occidentales intentan adjudicarse y, al hacerlo, mediatizar o cooptar. Pensar que el mundo occidental, el capitalismo, el cristianismo (o la laicidad construida sobre sus parámetros), son más favorables a las mujeres que la vida comunitaria en la reivindicación de su reconocimiento es una falacia, implica negar la movilización feminista y constituye la marca de un pensamiento colonizado o de un afán colonizador.

domingo, 17 de abril de 2011

ABORTO legal, seguro e gratuito.


Oi pessoas!!

Convidamos calorosamente para esta nova etapa que Mulheres Rebeldes estamos começando s: um bate papo mensal, aberto a toda comunidade.

Começaremos nesta terça-feira falando sobre ABORTO. Debateremos por que é necessária e urgente a legalização e descriminalização. Para isso contaremos com a presença de nossa companheira e ativista Clair Castilhos - Membra da Rede Nacional Feminista de Saúde e co-fundadora da Associação Casa da Mulher Catarina.
Recomendamos assistir este vídeo


Te esperamos com café e chimarrão para uma conversa descontraída no Moinho Negro - Espaço Libertário, nesta terça feira, dia 19 de abril , 18.30 horas na rua Marcílio Dias 1463. Bairro Azenha.

Nossos telefones : (51) 3333-3538 | 9239-1891 | 9253-4300

Por um mundo nem classista, nem sexista, nem racista libertação já!